Em risco o pagamento de mais de 200 mil pensionistas do Estado

Com mais de 400 mil funcionários públicos a descontar mensalmente 7% do seu rendimento, questiona-se o facto de a instituição gestora não prestar informação pública sobre a gestão destes fundos, as suas aplicações e os rendimentos obtidos.

O sistema de pensões dos funcionários públicos, gerido pelo Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), está a tornar-se insustentável e com um risco elevado para as finanças públicas.  Esta situação coloca em risco o pagamento a mais de 200 mil pensionistas do Estado.

A informação consta de um texto do Centro de Integridade Pública (CIP), que faz analise dos principais fatores que tornam o sistema de pensões insustentável, mostrando os riscos do colapso do sistema e a dificuldade do INPS honrar com a obrigatoriedade do pagamento de pensões aos funcionários e agentes do Estado.

Em causa está uma combinação de fatores, nomeadamente o aumento do número de beneficiários (pensionistas); a redução do número de funcionários e Agentes do Estado (FAE) contribuintes (para o fundo de pensões) e a falta de transparência na gestão dos fundos e nos investimentos realizados pelo INPS.

Em seis anos, de 2016 a 2021, devido às restrições de contratação de novos funcionários públicos, o número de pensionistas aumentou duas vezes mais que o número de funcionários públicos no activo1, tendo reduzido o rácio funcionários públicos por pensionista de 7,27 para 5,49. Isto significa que há cada vez menos funcionários que contribuem para o pagamento a um pensionista

Segundo o Documento que temos vindo a citar, nos anos 2022 e 2023, a implementação da lei de Segurança Social Obrigatória2 (que levará compulsivamente mais de 25 mil funcionários à reforma), a implementação da Tabela Salarial Única (que aumentou o salário base de funcionários que ocupam cargos de direção e chefia) e a inserção de mais de cinco mil antigos guerrilheiros da Renamo no sistema de pensões contribuíram para a sobrecarga do sistema de pensões.

O sistema de pensões visa garantir a subsistência dos trabalhadores nas situações de falta ou redução da capacidade de trabalho. Para tal, é necessário que este tenha indicadores de sustentabilidade capazes de fornecer benefícios aos usuários, atuais e futuros, sem comprometer a sua viabilidade financeira a longo prazo.

A degradação dos rácios FAE/Pensionistas, a incapacidade de a receita fazer face as despesas, a redução da idade de reforma, a falta de plano de investimentos e as baixas taxas de retorno são indicadores de que o fundo de pensões dos funcionários públicos está a tornar-se cada vez menos sustentável.

A falta de investimento aumenta o risco fiscal

A análise indica que esta situação poderá levar à incapacidade de o fundo honrar com os pagamentos aos pensionistas. A falta de investimentos, associada a incapacidade financeira do INPS para o pagamento das pensões, aumenta o risco fiscal. O Estado é chamado à responsabilidade, em caso de incumprimento, aumentando, deste modo, o orçamento para o pagamento de pensões e desviando os recursos dos outros sectores ou aumentando os níveis de endividamento.

O texto está dividido em nove secções. A primeira é composta pela introdução. Na segunda faz-se a ligação entre a redução da idade da reforma e o risco de colapso do sistema de pensões. Na terceira parte mostra-se a forma de cálculo do valor da pensão e como este aumenta os custos e prejudica o sistema de pensões. Na quarta secção faz-se a ligação entre a implementação da Tabela Salarial Única e a sobrecarga do fundo de pensões. Na quinta e sexta secção evidencia-se o crescimento da despesa com pensões, na última década, e os investimentos realizados pelo fundo de pensões. A sétima parte mostra como a falta de transparência na gestão do fundo de pensões pode prejudicar o sistema de pensões e as finanças públicas. A última secção apresenta as conclusões e recomendações.

Falta de transparência na gestão e aplicações do fundo de pensões

De acordo com o diretor do INSP, o fundo de pensões possui cerca de quatro mil milhões de MT canalizados desde 2018. Este valor está depositado em bancos nacionais. Entretanto, a inexistência de um plano de investimentos, a ausência de relatórios de atividades e a falta de transparência dos fundos de pensões colocam em causa a gestão do fundo e aumentam os riscos de insustentabilidade e de corrupção no processo de seleção do banco.

Os descontos para a reforma são obrigatórios e efetuados nas remunerações auferidas pelo funcionário até ao seu desligamento do serviço do Estado (em princípio após 35 anos de serviço). Com mais de 400 mil funcionários públicos a descontar mensalmente 7% do seu rendimento, questiona-se o facto de a instituição gestora não prestar informação pública sobre a gestão destes fundos, as suas aplicações e os rendimentos obtidos.

A falta de transparência estende-se aos documentos orçamentais que são omissos em relação aos investimentos realizados por esta instituição e a falta de resposta as cartas enviadas às instituições públicas para esclarecimentos.

A Conta Geral de Estado 2022 apenas se refere ao valor de 4,7 mil milhões de MT poupados nos bancos comerciais, não indicando em que bancos foram aplicados, os rendimentos obtidos, entre outras informações.

O número 3 do artigo 15, do regulamento do Fundo de pensões, indica que este deve elaborar e publicar relatórios e contas trimestrais até ao dia 30 do mês seguinte ao fim de cada trimestre. Entretanto, os mesmos não são elaborados.

A falta de transparência na gestão dos fundos de pensões dos funcionários públicos tem levantado questionamentos, principalmente na forma como são selecionados os bancos para as aplicações e as taxas de juros aplicadas.

Uma gestão eficiente do fundo de pensões pressupõe a existência de uma política clara de investimentos transparentes e disponível para que todos os funcionários possam ter acesso e acompanhar os investimentos realizados, à semelhança do que acontece em outros países. Na Áustria, por exemplo, os contribuintes podem aceder à carteira e aos investimentos realizados, e, ainda, ao desempenho do fundo ao longo do tempo.

Conclusões e recomendações

A análise conclui que o sistema de pensões de funcionários públicos está em vias de se tornar insustentável, devido a um conjunto de políticas públicas tomadas e implementadas pelo Governo. Tais políticas incluem a entrada em vigor da Lei sobre a Segurança Social Obrigatória, que reduz a idade da reforma obrigatória para 60 anos de idade, associada à fórmula utilizada para o cálculo da pensão, que considera o último salário base do funcionário e não a sua média do salário base ao longo da carreira e, por fim, a entrada em vigor da TSU, que aumentou o salário base dos funcionários públicos.

Como consequência, o rácio funcionário e agentes do Estado versus pensionista deteriorou-se, pondo em risco a sustentabilidade do fundo de pensões, à médio-longo prazo. A tendência crescente do número de pensionistas, as elevadas despesas com pensões e a deficiente gestão dos fundos e investimentos em áreas de risco são fatores que poderão levar à insustentabilidade do sistema de pensões e ao aumento do risco fiscal.

Esta situação torna urgente, não apenas a melhoria da gestão dos fundos, mas também a definição de um plano claro de investimento e projeções das despesas deste sector. O INPS não possui uma política de investimentos.

A gestão da carteira de investimentos do fundo de pensões requer uma política clara de investimentos, transparente e disponível para que todos os funcionários possam acompanhar os investimentos. A política de investimentos deve garantir maior rentabilidade, sustentabilidade, conforto para os participantes. E, acima de tudo, os investimentos devem ser de baixo risco de forma a evitar a perda de valores.

Recomendações

Dado os factos, recomenda-se ao Instituto Nacional de Previdência Social:

  1. A publicação dos relatórios da instituição, as aplicações financeiras realizadas, os planos de investimentos e toda a informação relevante relacionada às despesas e às receitas da instituição;
  2. Propor à Assembleia da República a revisão da fórmula de cálculo de pensões, passando a ter em conta a média das contribuições e não apenas o último salário base ou a média dos últimos cinco anos;
  3. A análise e publicações (em parceria com o Ministério da Economia e Finanças) das projeções de despesas e receitas do fundo de pensões para o curto e médio prazo.

 

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