Diversos responsáveis da extinta guerrilha colombiana das FARC admitiram esta sexta-feira, oficialmente, o seu envolvimento no sequestro de civis durante o conflito armado, num testemunho perante a Jurisdição Especial para a Paz (JEP), que os convocou para depor.
“Assumimos que nas FARC-EP tivemos a responsabilidade por ordenar sequestros e a privação de liberdade de forma prolongada de civis e de membros da força pública”, explicou Julián Galo, ex-líder das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército Popular (FARC-EP) e actual senador do partido Comunes, conhecido por “Carlos Antonio Lozada”.
A JEP, que surgiu do acordo de paz de 2016 na Colômbia como um sistema de justiça transitório, responsabilizou em 28 de Janeiro passado oito membros do antigo secretariado da guerrilha por crimes de lesa humanidade e crimes de guerra no Âmbito do “Caso 1”, onde estão registadas 2.107 vítimas de sequestros e outros crimes, em particular entre 1993 e 2012.
A dissolução da guerrilha das FARC diminuiu o nível de violência na Colômbia, mas grupos armados, incluindo com ligações à extrema-direita, continuam activos em zonas recuadas do país, alimentadas principalmente pelos recursos extraídos do narcotráfico.
Os antigos guerrilheiros das FARC e os líderes comunitários são considerados geralmente um obstáculo para estes grupos criminosos, que procuram controlar os territórios também para aumentar as culturas ilegais de coca destinadas ao fabrico de cocaína.
Centenas de ex-membros da guerrilha, incluídos no processo de desarmamento e reinserção social, e de activistas de direitos humanos foram assassinados na Colômbia desde o acordo de paz de 2016.
O país permanece ainda confrontado com as acções armadas do Exército de Libertação Nacional (ELN), a última guerrilha activa, para além dos narcotraficantes e de formações paramilitares.
Foi um erro gravíssimo
Em Setembro de 2020 o Partido nascido das FARC pediu perdão pelos sequestros cometidos: “Foi um erro gravíssimo”
Antiga cúpula da extinta guerrilha reconhece, quase quatro anos depois da assinatura do acordo de paz, que tirou das vítimas “sua liberdade e sua dignidade”
Desde o início, o processo de paz entre o Estado colombiano e as FARC teve uma dimensão simbólica decisiva no tortuoso caminho para a reconciliação. A mais antiga organização guerrilheira da América desmobilizou-se depois da assinatura do acordo de paz, há quase quatro anos, abandonou as armas, com exceção de alguns grupos minoritários de dissidentes, submeteu-se ao JEP, tribunal encarregado de julgar os crimes mais graves da guerra, e se tornou um partido político.
A esses passos concretos se junta uma série de gestos e declarações que, apesar das críticas de setores que ainda se opõem aos acordos de paz, representam uma guinada copernicana na história recente do país. Os principais dirigentes da antiga cúpula das FARC, encabeçada por Rodrigo Londoño, Timochenko, pediram perdão às vítimas de sequestro e suas famílias. “Queremos dizer-lhes que o sequestro foi um erro gravíssimo do qual só podemos nos arrepender”, reconhecem em um comunicado.
“O sequestro deixou apenas uma profunda ferida na alma dos atingidos e feriu mortalmente a nossa legitimidade e credibilidade. Tomada essa decisão, nas circunstâncias excepcionais da guerra irregular e buscando equilibrar as forças, tivemos que arrastar esse fardo que até hoje pesa na consciência e no coração de cada um de nós”, diz o texto divulgado pela Força Alternativa Revolucionaria do Comum, presente na Câmara e no Senado desde as eleições legislativas de 2018.
Fonte: RM