DIA DA MULHER MOÇAMBICANA: Celebrado entre luto, conquistas e desafios

Elas têm histórias diferentes, pertencem a classes sociais diferentes e gerações diversas, mas unidas numa mesma causa que é a luta diária pelo bem-estar das suas famílias, pelo desenvolvimento do país e por igualdade de direitos e de oportunidades. Em reconhecimento aos seus feitos, o país celebrou esta semana o 7 de Abril, data consagrada à mulher moçambicana em homenagem a Josina Machel, que foi esposa de Samora Machel, primeiro Presidente de Moçambique independente, e perdeu a vida a 7 de Abril de 1971, aos 25 anos, vítima de doença, em plena luta armada.

A data foi celebrada entre lágrimas, conquistas e desafios. Lágrimas pela situação do terrorismo na região norte da província de Cabo Delgado e dos ataques armados na região Centro do país. De Cabo Delgado chegam histórias dramáticas de mulheres no meio da violência.

Segundo o Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA), as mulheres constituem a maior parte dos deslocados por conflitos no norte de Cabo Delgado e pelo menos 127 mil estão em idade reprodutiva, correndo o risco de contrair gravidezes indesejadas.

O maior impacto destes constrangimentos recai sobre a mulher que é pilar da vida que sustenta as famílias e o futuro da sociedade. Elas deixaram tudo nas suas zonas de origem, outras perderam esposos, filhos e netos, e obrigadas a recomeçar a vida dependendo de apoios de pessoas de boa-vontade.

A representante do UNFPA em Moçambique, Andrea Wojnar, considera a violência do género, gravidez indesejada e mortes causadas por complicações no parto como algumas das consequências da violência.

Desde o inicio dos ataques em Cabo Delgado, em 2017, foram relatados muitos casos de mulheres que deram a luz no meio das matas, entre balas e fogo dos terroristas.

Dados do UNFPA em Moçambique dão conta que mais de 2,5 mil mulheres e meninas precisam de cuidados vitais em resposta à violência sexual.

Andrea Wojnar, prevê que cerca de 1,5 mil grávidas poderão passar por complicações obstétricas nos próximos seis meses.

Conquistas

A mulher celebra conquistas, porque é inegável o aumento da proporção de mulheres nos órgãos de tomada de decisões, a reforma da legislação sobre os direitos da mulher, o incremento do ingresso e retenção da rapariga na escola, a melhoria do acesso à saúde e o atendimento às vítimas da violência baseada no género.

Como ganho no sector da Educação, pode indicar-se a isenção do pagamento da matrícula no Ensino Primário, a elevação da escolaridade obrigatória para a 9.a classe e a distribuição gratuita do livro escolar, tudo isto, promove a oportunidade de acesso da raparigas à educação.

Na área económica, nota-se o crescimento do número de mulheres empresárias de sucesso por mérito próprio, muitas delas anónimas que no sector informal asseguram a produção de alimentos e riqueza das suas famílias.

Nos cargos de poder, como Assembleia da República, Conselho Constitucional, Tribunal Administrativo e a Procuradoria-Geral da República, temos mulheres a dirigir os pelouros”, disse Nyeleti Mondlane, sublinhando que 43,3 por cento dos 250 deputados são mulheres e no Executivo ocupam 47,5 por cento dos 21 ministérios.

A nível das assembleias provinciais existe uma representatividade de 35.64 por cento de mulheres e 54 por cento são secretárias permanentes.

Elas dirigem também 33,52 por cento das direcções provinciais, são secretárias permanentes distritais (27), administradoras distritais (32) directoras dos serviços distritais (16,33) e 19 por cento são chefes de postos administrativos. Por outro lado, 21 por cento das presidentes de localidade são mulheres.

Dos 53 municípios existentes, cinco são presididos por mulheres, o correspondente a 11 por cento, e nas assembleias municipais oito são presididas por mulheres, o equivalente a 15 por cento. Num total de 1196 membros existem nas assembleias municipais 450 são mulheres, o correspondente a 37,6 por cento.

Ao nível do poder judiciário, os dados apontam para a existência de 40 por cento de procuradoras-gerais-adjuntas, 37 por cento são procuradoras-chefes provinciais e 22 por cento juízes-conselheiras do Tribunal Supremo.

Na diplomacia, de um total de 42 embaixadores e cônsules quatro são mulheres, o que corresponde a 9,5 por cento. Neste momento o grande desafio é concretizar as metas de representação de mulheres a nível provincial e distrital

Desafios

Dentre os desafios, pode destacar-se a reduzida participação de mulheres nos órgãos de decisão ao nível dos conselhos consultivos distritais e de localidade, presidência de municípios e assembleias municipais.

No âmbito da educação, registam-se desafios na retenção e conclusão dos estudos pelas raparigas nos níveis secundário, devido a casamentos prematuros, enquanto na área de saúde, as taxas de mortalidade materna ainda são elevadas, entre outras fragilidades.

Persistem desafios no empoderamento económico das mulheres, no que se refere a formação, acesso aos meios produtivos e ao financiamento.

Outro desafio verifica-se no sector do trabalho doméstico, pois, apesar deste trabalho ser importante, tanto pelo número de postos de trabalho que o sector possui, assim como pelas implicações sociais e económicas que dele decorrem, há pouca valorização do mesmo.

O regulamento de trabalho doméstico proporciona menos direitos do que a Lei do Trabalho. Por exemplo, não estabelece um salário mínimo, não regulamenta de forma específica o trabalho desempenhado por menores e não faz referência ao assédio que acontece no contexto de trabalho.

Por outro lado, dada a relação desigual entre empregadas e empregador, e o mercado de trabalho precário em que as trabalhadoras domésticas operam, o aumento de remuneração para este trabalho é geralmente deixado à boa-vontade do empregador.

Apesar destes constrangimentos, aliados ao novo coronavírus, as mulheres comemoraram o seu dia, algumas nas bancas dos mercados ou dos seus quintais, se não mesmo nas ruas e outras nos campos de cultivo de onde encontram sustento para as suas famílias.

Porque o 7 de Abril é feriado nacional, aquelas que conseguiram preparar algo, reuniram-se em pequenos grupos nos seus bairros e, sem muitos alaridos devido à covid-19, comemoraram o seu dia, vendo-se mulheres de diferentes gerações e extractos sociais, unidas à volta da capulana que com as suas diversificadas cores torna Moçambique um país multicolorido.

JOANA MACIE