Gregório Leão e António Carlos do Rosário, são tidos como chaves importantes e espera-se que revelam detalhes sobre o que realmente aconteceu no escândalo financeiro que caloteou Moçambique durante o último mandato do Antigo Estadista, Armando Guebuza. Leão é o décimo oitavo réu em julgamento de um total de 19 réus envolvidos nas dívidas ocultas.
O réu Gregório Leão, que amanhã vai entrar no terceiro dia do interrogatório pelo tribunal, na tenda da B.O, em Maputo, afirmou terça-feira (28 de Setembro), que as empresas ProIndicus e a Moçambicana de Atum (EMATUM SA), esta última criada pelo Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), tinham objectivos distintos, mas negou entrar em detalhes sobre a EMATUM, alegando questões de segurança do Estado.
A ProIndicus tinha como objeto social principal a atividade de segurança marítima, principalmente no setor de gás e petróleo offshore, enquanto que a EMATUM tinha como objeto social principal a atividade de pesca.
Gregório Leão disse que a lei que cria o SISE está clara quanto a esta matéria, “é preciso ocupar o espaço sem limites, para poder-se buscar toda a informação necessária. Nós, se estamos reunidos neste tribunal e tudo a funcionar bem, é porque alguém está a fazer o seu trabalho. Pode a digníssima Sheila Marengule não entender as actividades do SISE, mas também não vou detalhar qual é a actividade concreta que havíamos de fazer, porque é actividade de inteligência”, explicou.
Gregório Leão afirmou ainda que pode parecer que o SISE é uma ilha dentro do Estado Moçambicano, mas não, só que tem atribuições que devem ser realizadas para um normal funcionamento das instituições e do Estado.
Explicou que porque haviam problemas da pesca ilegal, os meios da ProIndicus estavam destinados para o combate, mas antes de se aplicar a força, era necessário que fosse feito um trabalho para a identificação do perigo, que caberia a EMATUM. “Por isso, os meios da EMATUM são ligados a embarcações de pesca, enquanto que os da ProIndicu são de natureza militar”, disse.
Só que esta resposta não convenceu o juiz, que entende que todos os meios adquiridos pela EMATUM para a segurança, já tinham sido adquiridos para a ProIndicus, nomeadamente barcos, aeronaves, radares e satélites. “Mas também a EMATUM saiu mais cara do que a ProIndicus”, questionou o Juiz Efigénio Baptista, que explicou ainda que avançou ainda que EMATUM custou 850 milhões dólares norte americanos e a ProIndicus 622 mil dólares.
Segundo o juiz, dos 850 milhões de dólares, a EMATUM gastou 500 milhões de dólares para propósitos militares, enquanto já existia a ProIndicus para a protecção da Zona Económica Exclusiva.
“850 milhões de dólares foi o valor da criação da EMATUM, dos quais 350 milhões foram para a pesca do Atum e 500 milhões de dólares para a compra de meios militares”, esclareceu o juiz.
A uma pergunta sobre que meios militares foram adquiridos com o valor de 500 milhões de dólares, o réu disse que não queria responder, mas reiterou que o valor foi aplicado na compra de equipamentos e que António do Rosário, antigo director da Inteligência Económica do SISE, iria responder com detalhes e com as respectivas provas.
O réu foi ainda questionado se houve alguma decisão emanada de qualquer órgão, determinando a criação da EMATUM e a resposta foi: Se o tribunal não tiver pressa remeto o assunto ao António do Rosário.
Sobre quem concedeu o estudo de viabilidade da EMATUM, o réu remeteu-se ao silêncio.
O juiz lembrou ao réu que no mesmo dia que a EMATUM foi criada, 2 de Agosto de 2013, realizou-se uma Assembleia Geral para a eleição do Conselho de Administração e deliberar sobre a contratação de empréstimo externo.
De seguida, o juiz questionou ao réu sobre quem foram as pessoas eleitas para esses cargos, mas este, não respondeu, remetendo o assunto para o réu António do Rosário, que era na altura PCA da empresa EMATUM.
O tribunal questionou ainda se o estudo de viabilidade dizia que a EMATUM estava ligada a matéria de defesa e segurança, mas, mais uma vez o réu optou pelo silêncio.
Também foi questionado se a EMATUM terá celebrado algum contrato de concessão para a sua implementação, como aconteceu com a ProIndicus e, para esta resposta, o réu remete-se ao silêncio.
Sobre a motivação que levou a criação da EMATUM, Leão respondeu que a empresa foi criada porque o SISE precisava da parte comercial da pesca do atum, para poder pagar a dívida por si, “mas também a empresa tinha uma componente da inteligência, para a recolha de informação sobre o que se estava a passar no mar, uma vez que haviam informações sobre a existência de cerca de 100 embarcações que praticavam a pesca ilegal no mar moçambicano”, disse, acrescentando que pretendia-se aferir se as embarcações estavam envolvidas apenas na pesca ou se estavam a praticar outras actividades.
Entretanto, a Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM SA) é uma das três empresas responsáveis pelo escândalo das dívidas ocultas em 2016. A empresa foi fundada em 2013. No mesmo ano e no ano seguinte, o Governo moçambicano sob liderança do Presidente Armando Guebuza emprestou um total de mais de 2 mil milhões de dólares americanos de bancos e credores internacionais para financiar três empresas públicas: EMATUM, Mozambique Asset Management (MAM) e ProIndicus. A dívida original da EMATUM foi de 850 milhões. Estas obrigações não foram tornadas públicas, nem houve aprovação pelo Parlamento. Apenas em 2015 e 2016, ficou conhecido o volume real desta dívida.
Doadores internacionais como a Alemanha e o Fundo Monetário Internacional (FMI) pediram uma auditoria internacional e independente. Por causa das suspeitas de corrupção, os doadores internacionais suspenderam a sua ajuda direta ao orçamento do Estado, o que agudizou a crise econômica no país.