Sobre proposta de negociação com terroristas Rodrigues Lapucheque

Introdução

NO quadro dos esforços combinados entre a busca de solução militar e político-diplomática na guerra de agressão armada que nos é movida pelos terroristas islâmicos radicais da célula da organização extremista da Al-Shabab, de Abú Yasir Hassan, na província de Cabo Delgado, recentemente o antigo Presidente da República de Moçambique, Joaquim Chissano, avançou uma proposta, no sentido de o Estado moçambicano negociar com os referidos terroristas para pôr fim a este conflito armado sangrento que assola o nosso país.

Oportunidade da proposta

Analisando a proposta, levando em consideração as centenas de vidas humanas das populações civis indefesas que se perdem, bem como a destruição dos seus bens e a destruição das suas casas e com vista a travar essas acções bárbaras desmedidas e exageradamente cruéis e desumanas, é de considerar como importante e pertinente. Importa considerar que a maior parte das guerras de guerrilha no mundo, via de regra, as Forças Armadas regulares, não têm saído vencedoras, senão negociando com as forças guerrilheiras adversárias, em busca de uma solução pacífica do conflito armado que então opõe as partes beligerantes.

No caso concreto da guerra de agressão armada protagonizada pelos terroristas da organização extremista da Al-Shabab, de Abú Yasir Hassan, em Cabo Delgado, quanto à proposta em referência, algumas questões de extrema importância devems er  colocadas e são elas:

Existem figuras já devidamente identificadas que lideram esta guerra, com quem se deve negociar?

Em relação a esta pergunta, até aqui dois nomes diferentes foram apontados: 1) Ȧbudo Rogo, um cidadão de nacionalidade etíope, radicado na Somália que, tendo saído deste país, passou por Quénia e por Tanzania e, finalmente, veio fixar-se em Moçambique, concretamente no distrito de Mocímboa da Praia, província de Cabo Delgado. Aqui começou por aliciar as comunidades locais em dinheiro, dólar americano, passo subsequente, de forma gradual, começou com as suas acções de desestabilização, conforme revelação feita por um Sheik, representante do Conselho Islâmico de Moçambique em Cabo Delgado; e 2) Abú Yasir Hassan, nome revelado pelo Embaixada norte-americana em Moçambique, num relatório difundido pelos meios de comunicação social, em Maputo.

Relativamente aos dois nomes acabados de mencionar, um facto que desperta atenção é que ambos provêm de fontes idóneas e credíveis.

Em face desta dúvida, com qual dos dois nomes se deve negociar?

A nosso ver, um trabalho conjunto ou independente, entre os Serviços de Informação das FADM, da PRM e do SISE, a realizar-se em tempo oportuno, cooperando com os três atrás mencionados países por onde passaram os terroristas até se fixarem no nosso país, ou cooperando, em simultâneo, com um outro país, por exemplo, Comores, que tem um profundo conhecimento da realidade da zona em análise. Quando assim se concluir ser necessário, acaso, nos conduziria a encontrar algumas pistas que nos conduzissem a identificar os verdadeiros cabecilhas dos terroristas?

O Estado moçambicano acaba de receber apoio militar das Forças Armadas da SADC e do Ruanda, a fim de combater os terroristas em Cabo Delgado e, de acordo com as informações que vêm sendo divulgadas pelos órgão de comunicação social nacionais, credíveis, as tropas ruandesas, juntamente com as FADM, em pouco tempo que realizam operações conjuntas já têm Mocímboa da Praia sob controlo. Ainda, de acordo com as nossas pesquisas, os mesmos pretendem ocupar e apoderar-se do porto deste distrito, a fim de realizarem seus desembarques navais para o abastecimento logístico das suas forças guerrilheiras na parte continental e, finalmente, instalarem um Estado Islâmico no nosso país. Mas, o período de permanência no campo da batalha em Cabo Delgado, estabelecido para as Forças Armadas da SADC e do Ruanda, é de três meses, prorrogáveis por igual período.

Face a essa constatação, durante o período em que as operações estiverem em curso, antes de se apurarem os respectivos resultados definitivos, seria oportuno encetarem-se tais negociações com os terroristas?

A propósito, não constituiria isso um embaraço para esses países que vieram apoiar-nos para, em pouco tempo, antes de completar pelo menos os primeiros três meses acordados, pensarmos em negociação?

Que interpretação dariam eles sobre a nossa seriedade político-diplomática e militar?

Quanto a nós, a negociação com os terroristas é, deveras, importante, pertinente e necessária mas, duas condições imprescindíveis se colocam: i) a identificação clara dos cabecilhas dos terroristas com quem negociar; e ii) aguardarmos que, pelos menos, passem os três primeiros meses acordados para a permanência das Forças Armadas da SADC e do Ruanda no campo da batalha em Cabo Delgado e, ao mesmo tempo, verificarmos os correspondentes resultados alcançados nessa batalha.

Conclusão

A proposta avançada pelo antigo Presidente da República, Joaquim Chissano, é importante e pertinente mas, quanto à oportunidade, precisa da verificação de algumas condições prévias, quais sejam:

  1. A identificação clara e inequívoca dos nomes dos cabecilhas dos terroristas com quem negociar; 2. Aguardarmos que se completem, pelo menos, os três primeiros meses estabelecidos para a permanência das Forças Armadas da SADC e do Ruanda no teatro operacional em Cabo Delgado e, daí, vermos os resultados que estas Forças vão produzir no terreno.

A partir daí, se se concluir que os resultados militares no campo da batalha não produziram o resultado desejado, então, gradualmente, se vão procurando accionar os mecanismos político-diplomáticos para a negociação com os terroristas, a fim de se encontrar uma solução pacífica do conflito armado que nos assola.

Agindo desta forma, na nossa modesta opinião, por um lado evitamos interpretações conotadamente impróprias e erróneas a nosso respeito e, por outro, preservamos o bom nome, imagem, dignidade, admiração e respeito que, geralmente, o nosso Estado goza no seio desses países da região da África Austral, da África em geral e do mundo inteiro.

Coronel de Infantaria Motorizada pela Academia Militar General José Maceo y Grajales, Santiago de Cuba, Doutorado e Mestrado em Direito e Segurança pela Universidade Nova de Lisboa, Mestrado em Administração Pública pela Universidade Politécnica – A POLITÉCNICA, Licenciado em Direito pela UEM; é docente universitário.

(Publicado no Notícias do dia 11 de Agosto de 2021)