Vaticano. Freira amiga do Papa quebra protocolo

Paramentados a rigor, cardeais, bispos e outros religiosos do Vaticano caminhavam esta quarta-feira até perto do caixão onde está o Papa Francisco, na Basílica de São Pedro. Junto ao cordão vermelho que limita o espaço de aproximação ao corpo, os fiéis (homens, maioritariamente) com prioridade faziam uma vénia e um sinal da cruz — numa coreografia que durava pouco mais do que uma dúzia de segundos.

Enquanto isso, discretamente, uma pequena freira de 81 anos, com uma mochila verde às costas, quebrou o protocolo e aproximou-se do caixão. À distância permitida pelo protocolo de segurança, ficou largos minutos a rezar, intercalando o olhar fixo no caixão com a passagem de um papel pelo rosto, com o qual tentava disfarçar as lágrimas.

Geneviève Jeanningros permaneceu ali bastante tempo — sobretudo quando comparada com a brevidade das restantes homenagens —, mas sem ser afastada pelos seguranças, como mostram as imagens da Vatican News. O rígido protocolo determinava que as primeiras despedidas fossem reservadas a cardeais, bispos e religiosos ligados ao trabalho no Vaticano.

A determinação da franco-argentina em estar junto do caixão de Francisco, falecido esta segunda-feira, terá sido motivada pela vontade de prestar homenagem a um amigo antigo.

Geneviève dedicou os últimos 56 anos da sua vida a atender pessoas homossexuais e transexuais num circo dos arredores de Roma, onde vive numa caravana, em total pobreza. Sem luz elétrica, com poucas condições e reduzida recolha de lixo, estas dificuldades nunca a impediram de ajudar os outros.

Em julho de 2014, Francisco quis visitá-los numa das suas saídas por Roma, relata a ACI. Várias vezes a freira levou um grupo de transexuais — obrigados a viver da prostituição — a Audiências Gerais celebradas pelo Papa no Vaticano.

A relação entre os dois, contudo, não surgiu aí e remonta aos tempos em que Francisco era apenas Jorge Bergoglio e ocupava a função de Arcebispo de Buenos Aires.

A freira, apelidada de ‘enfant terrible’ pelo Pontífice, era sobrinha de Leonié Duquet, freira desaparecida em 1977 durante a ditadura argentina e encontrada numa vala comum junto aos restos mortais de Esther Ballestrino, chefe do Papa quando este era um jovem trabalhador num laboratório de química.

Esse conhecimento mútuo levou a freira a quebrar o protocolo e a prestar homenagem ao velho amigo antes da enorme multidão de fiéis que se concentra em Roma para a despedida a Francisco. Fonte : O observador.