Grilo Lubrino, psicólogo organizacional do trabalho e antigo director Nacional de Estudos e Procedimentos Administrativos, alerta que o nível que o país atingiu de delinquência e de incumprimento das leis e normas, é assustador e, para a normalização da situação convida as lideranças a apresentarem evidências de integridade. “Os governados não devem ter dúvidas da idoneidade dos seus dirigentes”.
Segundo Grilo Lubrino, hoje fala-se da corrupção que se tornou cancro em quase todas as instituições públicas e privadas, mas qualquer que seja a vontade política de combatê-la, ela tornar-se-á ineficaz se estiver inserida numa sociedade e numa cultura corrupta”.
Falando numa entrevista à Revista ÀGORA, Lubrino, entende que para a construção de uma cultura íntegra, é indispensável implementar medidas práticas e exemplares, que se reflitam no rigoroso cumprimento das normas, dos princípios e dos valores. “Infelizmente, a ética e a moral perderam-se na nossa sociedade”.
Sobre até que ponto o surgimento de muitas igrejas pode ajudar na moralização da sociedade, Grilo Lubrino, entende que elas , por si só , não são suficientes, porque não são autoridades administrativas. “O pior é que muitas das pessoas que frequentam essas Igrejas, não o fazem em busca de valores, mas sim à procura de respostas para as suas dificuldades e interesses, que não encontram no seio familiar, na sociedade, muito menos na estrutura política e administrativa”.
Segundo o psicológo, nem tudo está perdido, pois ainda existem as igrejas conservadoras que mantêm o princípio fundamental de salvar almas e transmitir os valores morais da humanidade. No entanto, esses valores não encontram correspondência na sociedade atual.
“É importante lembrar que quem administra a sociedade não são os religiosos, mas os políticos. E, muitas vezes, a política orienta-se por interesses meramente partidários. Os partidos políticos têm as suas filosofias, os seus programas e os seus interesses , e é isso que eles defendem. Quando vão à disputa, vão exatamente à busca de ganhar espaço”.
Grilo Lubrino, defende que quem administra o ordenamento social e ético são as políticas de governação e, quando estas não transmitem devidamente valores educativos, o resultado é desastroso. “As pessoas seguem o exemplo prático. Se nós não liderarmos pelo exemplo, não podemos esperar resultados diferentes e, é aqui onde entra o conceito da liderança”.
Defende ainda que é importante que se resgate alguns conceitos fundamentais, como honra, a dignidade e a integridade, porque são esses que unem as pessoas. Fora deles, colidimos, atropelamos os outros e provocámos, por vezes, o caos.
Substituir o termo “Funcionário do Estado” por “Servidor Público”,
O psicológo que foi também diretor de uma área responsável pela Estratégia de Combate à Corrupção a nível nacional, contou que durante a sua carreira orientou muitas palestras e, confessa que enfrentou várias dificuldades, principalmente pela resistência de pessoas que não acreditavam nas teorias de combate à corrupção.
Segundo explicou, essas pessoas, viam isso como um desafio impossível. “E parecia uma dissonância cognitiva. Vou dar alguns exemplos que, embora pareçam insignificantes, têm um impacto profundo. Uma vez fui convidado a dar uma palestra numa Faculdade de Ciências Sociais, dirigida aos estudantes de Administração Pública. Antes de iniciar a palestra, perguntei aos estudantes quem queria ser rico, todos levantaram a mão. Então, eu disse-lhes: Que vim ao sítio errado, porque se vocês estão a fazer o curso de Administração Pública, eu imagino que muitos de vocês querem entrar para o Estado. Sendo assim, como é que vocês querem entrar para o Estado com a ideia prévia de serem ricos? Então, conclui que eles não têm a ideia de que estão a fazer o curso de Administração Pública para serem servidores públicos”, disse , acrescentando que a conclusão que teve foi de que essa palestra não tinha valência para eles.
Grilo Lubrino, propõe a substituição do termo “Funcionário do Estado” por “Servidor Público”, para que as pessoas tenham a noção real de que trabalhar para o Estado é servir o público. Disse que as pessoas até podem ficar ricas trabalhando para o Estado, mas de que maneira? Uma possibilidade seria através de uma atividade extra.
No entanto, segundo explicou, existe um problema, pois, o Estado tem exclusividade deste funcionário, exceptuando nas situações em que o funcionário tem autorização para dar aulas. E, se tem exclusividade para fazer actividade extra no Estado, tem que ser autorizado. Muitas das vezes não é autorizado , porque um funcionário do Estado é funcionário 24h. Muita gente não sabe disso, mas o indivíduo é funcionário até a sua reforma. Mesmo na reforma, ainda continua funcionário do Estado, continuando a manter a sua postura, a sua maneira de ser e de estar em todas as ocasiões. Tens de ser o exemplo. O Estado tem que ser o exemplo em tudo. Por isso, em países como Estados Unidos, Suécia, China, entram para o Estado os melhores.
“Nós como país falhamos bastante”
Para Lubrino, o grande dilema é que o funcionário público não consegue ser exemplo. “Nesse aspecto, nós como país falhamos bastante”, porque houve um período em que tínhamos que ocupar os espaços deixados pelos colonos e buscáva-se todo o indivíduo, desde que tivesse capacidade para fazer as coisas, as vezes sem instrução académica, primáva-se pela quantidade.
Grilo Lubrino lembra que o Estatuto Geral do Estado tem um artigo que diz respeito ao ingresso na Função Pública, que diz que o indivíduo que quer entrar para o Estado tem de apresentar um atestado da aptidão física e mental. Mas o certidão que se emite só diz respeito à aptidão física, porque o país ainda não tem serviços para a aptidão mental. “Temos uma instituição que fazia avaliações psicotécnicas que podia nos dar exatamente a informação a cerca da aptidão mental dos indivíduos, mas nunca foi usada para esse efeito”.
“Estamos a recrutar pessoas que não conhecemos o seu estado mental. E como resultado reclamámos pela má conduta do polícia que se envolve em raptos; em assassinatos e em assaltos”, disse insistindo na necessidade de se fazer o apuramento da qualidade na hora do recrutamento.