Segundo o acadêmico moçambicano Calton Cadeado, esta pergunta dá uma dimensão micro de análise, mas ao mesmo tempo macro. “Culturalmente estamos alinhados, mas quando vamos para a dimensão de relações internacionais há conceitos e realidades políticas que podem ser complicados e, sobretudo, numa região como Àfrica Austral com uma história de cumplicidade muito forte.
Para Calton Cadeado, o primeiro aspecto é a questão da ingerência, “é muito forte isto. A sua casa pode estar a arder de facto, mas se não chamares o vizinho para ajudar-te a apagar o fogo, ele não terá como entrar, sob o risco de ser acusado de ingerência. E aqui estamos a falar de apagar o fogo com a intervenção das Forças Armada”.
Nos seus discursos sobre este tema, o Governo moçambicano tem dito que qualquer um que vier prestar qualquer apoio, tem que ser para ajudar de facto, mas os moçambicanos devem ser os primeiros a agir e, a lei está clara quanto a isso: “O Estado e as Forças de Defesa e Segurança tem a responsabilidade de defender a pátria. São eles que devem dar o seu máximo até a sua última gota de sangue”.
Segundo o académico, o assunto de ingerência pode dar outro tipo de conflitos internacionais entre Estados, numa região em que se fala de uma solidariedade muito forte criada ao longo da história.
“Mas tmbém existe o conceito da soberania, estes líderes que criaram a SADC e os Estados conhecem muito bem estas dinâmicas e sabem que hoje não é bom criar inimigos dentro da própria região”.
Para quem está a viver a situação de terrorismo, como é o caso de Cabo Delgado, vai chegar tarde a intervenção da SADC, mas é preciso “termos a consciência de que os Estados agem com prudência porque a precipitação pode criar outro tipo de problemas, talvez mais dificil de gerir futuramente.
Calton Cadeado prefere não olhar a determinação dos países da SADC como bloco, mas de forma individualizado. “Na Àfrica do Sul por exemlo, é inquestionável o movimento de pressão para a intervenção do seu Presidente que ao mesmo tempo é Presidente da União Africana, mas este governo sabe que não pode intervir sem o convite do Governo moçambicano“.
Desde que iniciaram os ataques armados no norte de Cabo Delgado, os terroristas já invadiram os distritos de Mocímboa da Praia, Macomia, Nangade e recentemente, Palma, tendo provocado a morte de mais de duas mil pessoas e cerca de 700 mil deslocados. Só em Palma, o impacto foi de 50 mil deslocados e centenas de refugiados.
Sobre a alegada recusa da entrada dos refugiados moçambicanos a Tanzânia, o académico Calton Cadeado, explica que existem aqui elementos de segurança, uma vez que a Tanzânia também está aflito por ver a situação do vivida em Moçambique.
Para o académico, a entrada de muitas pessoas ao mesmo tempo, pode permitir a entrada dos terroristas, mas ao mesmo tempo a Tanzânia está a violar uma convencção internacional que obriga os Estados a não repatriar pessoas para locais onde estão a fugir por temer a sua vida.
“Isto é também um dilema para o Estado tanzaniano, que tem que proteger a vida sem por em causa a segurança do Estado, ou proteger o Estado sem por em causa a vida das pessoas”, disse, defendendo que mesmo assim, o correcto teria sido confinar as pessoas num determinado local para a triagem, mas nunca mandar de volta.
Entretanto, uma equipa técnica da SADC deverá ser enviada de imediato a Moçambique para produzir um relatório a ser apresentado numa reunião extraordinária do comité ministerial da Troika que se reúne no próximo dia 28 de abril, na véspera de uma cimeira extraordinária do órgão.