Epilepsia e os seus mitos: Doença que atormentava o repper Azagaia

Na verdade ele sofria de epilepsia e sempre desmaiava, mas quando a família estivesse por perto levava-o para uma posição onde pudesse apanhar ar, geralmente no quintal. Acreditamos que ele teve a crise quando descansava “, disse um familiar do cantor, Edson da Luz (Azagaia).

Em comunicado de imprensa que anuncia o programa fúnebre do cantor, a família Da Luz admite que Azagaia foi vítima de epilepsia. Aliás, o próprio cantor confirmou isso em Junho de 2014, numa entrevista na TV Miramar, ao afirmar que “o consumo da canábis na altura se devia a recomendação médica dado padecer de epilepsia”.

De acordo com a OMS, as mortes por epilepsia em Moçambique atingiram 1.082 ou 0,42 por cento do total de mortes no período 2020-2021. A taxa de morte ajustada à idade foi de 4,75 por 100.000 habitantes no mesmo período.

Em 2016 por exemplo, foram diagnosticados 65.260 casos contra 33.670 em 2015 e 15.545 casos em 2014. Para controlar e tratar a doença neurológica, o Ministério da Saúde está a implementar desde 2013 em todas as regiões do país o Programa para a Redução da Lacuna no Diagnóstico e tratamento da epilepsia.

Esta doença é conhecida em muitos pontos do país como doença da lua e é hoje uma das doenças neurológicas mais comuns no mundo. Em Moçambique, a epilepsia é a primeira causa de procura nos serviços psiquiátricos e nas consultas neurológicas.

Dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem da doença crónica, sendo que 80 por cento dos casos são registados em países em vias de desenvolvimento.

Moçambique apresenta uma taxa de três por cento, razão pela qual o país consta da lista dos países com índices elevados da doença.

A epilepsia pode atingir homens, mulheres e crianças de todas as idades. De acordo com a psiquiatra Luciana Massinga, as complicações durante o parto, infecções

cerebrais: meningite, encefalite, malária cerebral, aumentam o risco de ter epilepsia.

Segundo a OMS, cerca de 25% dos casos podem ser prevenidos. A epilepsia é uma doença do sistema nervoso central onde ocorrem intensas descargas eléctricas que não podem ser controladas pela própria pessoa, causando sintomas como movimentos descontrolados do corpo e mordida da língua, por exemplo.

Esta doença neurológica não tem cura, mas pode ser controlada com os medicamentos indicados pelo neurologista. Na maioria dos casos, quem tem epilepsia pode ter uma vida normal, porém deverá realizar o tratamento por toda a vida para evitar as crise.

 

OMS destaca escassez de tratamento em países de baixa renda

Tratamento de cinco dólares (cerca de 315 medicais) pode evitar crises durante um ano, risco de morte prematura entre os pacientes é até três vezes maior do que na população geral.

Moçambique faz parte de programas da OMS que permitiu aumentar acesso a tratamento para 6,5 milhões de pessoas em oquatro países.

Três quartos das pessoas que vivem com epilepsia em países de baixa renda não recebem o tratamento de que precisam, aumentando o risco de morrer de forma prematura e condenando muitos a uma vida de estigma.

A conclusão é do estudo “Epilepsia, um imperativo de saúde pública”, publicado em 2021 pela Organização Mundial da Saúde, OMS, e parceiros da sociedade civil.

Tarun Dua, especialista da OMS disse que “a lacuna de tratamento para a epilepsia é inaceitavelmente alta, quando se sabe que 70% das pessoas com a doença podem ficar livres de crises quando têm acesso a medicamentos que podem custar apenas 5 dólares por ano.” 

Além disso, o risco de morte prematura em pessoas com epilepsia é até três vezes maior do que na população geral.

Em países de renda baixa e média, este risco é significativamente maior do que em países de alta renda. As causas são falta de acesso aos serviços de saúde e causas que podem ser evitadas, como afogamento, ferimentos na cabeça e queimaduras.

Perto de metade dos adultos com epilepsia tem pelo menos mais um problema de saúde. As condições mais comuns são de saúde mental, com 23% destes adultos vivendo com depressão e 20% tendo ansiedade. 

Segundo a OMS, estas questões podem piorar as convulsões e reduzir a qualidade de vida.

Além destes problemas, entre 30% e 40% das crianças com epilepsia têm dificuldades de desenvolvimento e aprendizagem. 

 

Estigma

Segundo o relatório, o estigma também é generalizado. Segundo a OMS, o problema “é um dos principais fatores que impedem as pessoas de procurar tratamento.”

“Muitas crianças não vão à escola e os adultos têm direitos negados como trabalhar, dirigir e até casar. Essas violações dos direitos humanos precisam ter um fim.”

A OMS diz que campanhas de informação pública nas escolas e locais de trabalho e a introdução de legislação também são elementos importantes da resposta da saúde pública.

Em relação ao tratamento, a OMS mostra que, quando existe vontade política, o diagnóstico e o tratamento da epilepsia podem ser integrados com sucesso nos serviços primários, destacando programas-piloto da OMS que foram introduzidos em Gana, Moçambique, Mianmar e Vietnã. 

Segundo a agência, a iniciativa permitiu que mais de 6,5 milhões de pessoas tenham acesso ao tratamento para epilepsia, caso precisem.

O presidente da Liga Internacional Contra a Epilepsia, disse que o mundo sabe “como reduzir a lacuna de tratamento”, mas “a ação para introduzir as medidas necessárias precisa ser acelerada.”

 

O que é verdade e o que é mito sobre a epilepsia

A epilepsia é uma doença mental.

Mito. Ela é uma doença neurológica e não mental.

Toda convulsão é epilepsia.

Mito. A crise convulsiva é uma crise epilética na qual existe abalo motor. Mas, para uma pessoa ser diagnosticada com epilepsia é preciso que ela apresente repetição de suas crises epiléticas, ou seja, é possível a pessoa ter uma crise epilética (convulsiva ou não) e não ter o diagnóstico de epilepsia.

A epilepsia pode ter causa genética ou adquirida.

Verdade. As causas adquiridas constituem a grande maioria e incluem: traumatismo craniano, lesões perinatais e infecções encefálicas, entre elas a neurocisticercose e o acidente vascular cerebral. Em alguns casos, a causa não é identificada.

Devemos segurar os braços e a língua da pessoa durante uma crise convulsiva.

Mito. Nunca introduza os dedos na boca do paciente, pois as contrações musculares durante a crise convulsiva são muito fortes e inconscientemente a pessoa poderá mordê-lo. Não tente interromper os movimentos dos membros e nem ofereça nada para a pessoa ingerir. O ideal é colocar o paciente deitado com a cabeça de lado para facilitar a saída de possíveis secreções e evitar a aspiração de vômito. 

É possível manter a consciência durante uma crise de epilepsia.

Verdade. A manifestação clínica da crise epiléptica relaciona-se com a área do cérebro de onde a crise é gerada. Por isso, as crises epilépticas apresentam-se de diferentes maneiras, como com ou sem alteração da consciência do paciente.

A epilepsia pode acometer todas as idades.

Verdade. A doença pode acometer desde o período neonatal até o idoso, além de poder ter início em qualquer período da vida.

A epilepsia sempre causa dificuldades mentais.

Mito. A maioria dos pacientes com epilepsia tem inteligência absolutamente normal, alguns até acima da média. Apenas uma pequena parcela destes pacientes pode apresentar patologias que causam dificuldade intelectual associada às crises.

Pacientes com epilepsia podem dirigir.

Verdade. A princípio a epilepsia e o fato de usar medicamentos antiepilépticos não incompatibilizarão o candidato à direção de veículos. Porém, pacientes que não estiverem com seu quadro controlado, apresentando frequentes crises com alteração de consciência, não podem dirigir. Ou seja, pessoas com intervalos curtos entre as crises não devem dirigir e aquelas com longos intervalos entre suas crises podem ser consideradas capazes de dirigir com segurança.

O paciente com epilepsia pode ter uma vida normal.

Verdade. Pacientes com epilepsia, desde que estejam com os episódios de crises controlados, podem e devem ser inseridos completamente na sociedade e ter uma vida normal, ou seja, devem trabalhar, estudar, praticar esportes, se divertir.

Joana Macie

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